Colunistas
Reflexões pitagóricas
Você sabe o número do seu endereço; do tamanho do seu calçado; da data do seu nascimento; de tantas outras informações necessárias para sobreviver. Telefone próprio, da mãe, do trabalho, dos “contatinhos” para sair no fim de semana. Gabriel Pensador já cantava, no passado, a lista alfabética inteira para conseguir um chamego na madrugada. “2345meia78, coloca um caderninho no bolso, apanha umas fichas e corre prum orelhão”, dizia a letra do poeta, numa época distante da existência dos vários grupos de WhatsApp e dos aplicativos que marcam relacionamentos. Na prateleira dos amores, você é sim ou não, coração ou descarte. Você só é mais um número na tabela de conquistas.
No cartão de ponto, o horário de chegada. Susto nos dígitos do pagamento caso ultrapasse ou adiante alguns minutos no fim do expediente. No crachá, a matrícula para abrir a catraca, mas se a memória falha e o danado fica em casa, o porteiro olhará com expressão de paisagem para perguntar: quais são os quatro últimos números do seu registro? Nem adianta argumentos, de quanto tempo você oferece seus préstimos à empresa, o cumprimento generoso, diariamente, ao guardião da guarita: o computador só aceita a sequência Fibonacci, quase infinita, que te foi dada no dia da contratação. Como se lembrar de tanta regra para compor o seu DNA numérico?
Vai preencher algum cadastro? Currículo? Contrato? Tenha em mãos: os 11 algarismos do CPF, mais oito da carteira de identidade (dependendo de onde você nasceu), os 12 dígitos do título de eleitor, os seis do passaporte, a matrícula do plano de saúde, a placa do carro, a distância de sua casa em quilômetros para receber o vale-transporte, contados um a um. Se for homem, ainda tem os dados do certificado de reservista. E ainda há uma lista sem fim para você existir como consumidor: número do cartão de crédito (sorte de quem tem apenas um) e das contas fidelidade da Renner, da C&A, da Riachuelo, da Saraiva, da Siciliano, do IFood, do Rappi, da Zara, e do shopping inteiro. Se não tiver o CVV (código de verificação do cartão), a compra é bloqueada. A propósito, já pagou a conta de três dígitos deste mês?
Está anotando? Ou tudo está na memória? Para se lembrar de outros sinais que nos identificam, segue uma cola de ferramentas que necessitam de senhas com o mínimo (isso mesmo, o mínimo) de oito, OITO números para funcionar: Facebook, Instagram, Twitter, E-mail (pessoal e empresarial), Windows, Apple, ITunes, Spotify, Uber, 99, Cabify, Google Drive, Net, Sky, aplicativo da operadora de celular, Amazon, Netflix, GloboPlay etc, etc, etc. Parei! Contudo, tem aquela sequência que é segredo de Estado: a senha para desbloquear o telefone. Ninguém esquece, não é mesmo? Oremos para quem inventou o desbloqueio via touch e para que não inventem guilhotina para dedos distraídos…
Poderia ainda enumerar vários códigos que nos classificam (mas só posso escrever em 3200 caracteres para este artigo ser aprovado): taxa do colesterol, proporção áurea, o valor do dólar, do salário, o limite do cartão, as bolinhas da Mega Sena, o chip, a identidade profissional, as plaquetas, as vitórias do time, as estrelas conquistadas no céu por meio das boas ações. Sem defender nem divulgar subliminarmente a marca de uma cerveja, pergunto: onde, quando, como e porquê, você será o número 1?
Quem sabe numa próxima data mística (20/02/2020), eu escreva sobre a numerologia que nos rodeia?