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Há 50 décadas, John Lennon fazia seu último show – e foi um dia histórico

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Há exatos 50 anos, naquele aparentemente longínquo 30 de agosto de 1972, uma quarta-feira em Nova York, John Lennon fez um show pela última vez. Com Yoko Ono, ele subiu ao palco armado no Madison Square Garden (Lennon voltaria ao Madison em 1974, mas para uma breve participação no show de Elton John) para tocar algumas canções no concerto beneficente “One to One”, realizado a fim de levantar recursos para a instituição Willowbrook, que cuidava de crianças com deficiência. Foram duas apresentações – uma na parte da tarde, outra à noite. Antes de John, Sha Na Na, Stevie Wonder e Roberta Flack também tocaram.  As informações são do jornal O Tempo.

Em meio ao envolvimento com a chamada Nova Esquerda estadunidense, financiando movimentos e jornais alternativos ao mesmo tempo em que era grampeado e seguido pelos capangas de Richard Nixon, preocupado com a influência do ex-beatle entre os jovens, Lennon se animou a fazer o show. Ele estava, inclusive, disposto a repetir a dose.

O “One to One” era para ser só o primeiro de uma série de shows. “Eu estava pronto para sair em turnê por pura diversão. Eu não queria cair na estrada por dinheiro. Minha vontade era sair por aí tocando, simplesmente. Qualquer pretexto – caridade ou o que fosse – bas­taria para me convencer”, Lennon afirmou à Rolling Stone naquela ocasião.

Os bastidores da apresentação e os agitados primeiros anos morando nos Estados Unidos estão muito bem contados no livro “John Lennon em Nova York – Os Anos de Revolução”, de James A. Mitchell.

Em 1972, John Lennon tinha dois discos solo na bagagem, os ótimos “Plastic Ono Band” e “Imagine”, e o álbum-crônica “Some Time In New York City”, seu manifesto político mais contundente, lançado dois meses antes do show. E foi com esse repertório que ele, um bocado nervoso, encarou o Madison lotado.

Quem acompanhou Lennon no palco foi a Elephant’s Memory, banda formada por músicos da cena underground nova-iorquina, com a qual ele e Yoko gravaram “Some Time…” e passaram a primeira quinzena de agosto ensaiando. Lennon subiu ao palco vestido com uma jaqueta verde-oliva  do exército dos Estados Unidos. No rosto, os óculos redondos com lentes azuis. “Bem-vindos ao ensaio”, disse às 15 mil pessoas presentes.

John Lennon abriu os trabalhos com “New York City”. De “Some Time In New York City” também vieram a feminista “Woman Is the Nigger of the World”, influência direta de Yoko Ono na cabeça do marido, “Born In a Prison”, de Yoko, e “Sisters, O Sisters”. A açucarada e anticapitalista, antirreligiosa e antinacionalista “Imagine” não podia faltar.

Antes de “Come Together”, a única que pinçou do repertório com os Beatles, o humor típico de Lennon aparece: “Vou tocar essa música pela primeira vez desde que saí dos Rolling Stones”. “Cold Turkey”, de 1969, sobre a dependência e a batalha física e psicológica contra a heroína, é pura catarse e terapia primal. Impressionante a interpretação de Lennon. Um espetáculo. Ao fim, ele dá outra tirada: “Espero que tenham se divertido”.

Comovente e corajosa, “Mother” é Lennon ao piano acompanhado pela bateria seca. Nada mais. Um dos últimos números do concerto é “Hound Dog”. Todos pulam e se divertem no palco. Antes de terminar a canção, entre um dos provocativos versos “you ain’t nothin’ but a hound dog cryin’ all the time”, John, já completamente distante do nervosismo inicial, se declara: “Elvis, eu te amo”. O show no Madison Square Garden termina “Give Peace A Chance”.

O “One to One” era para ser o primeiro de muitos de uma turnê um dia desejada por Lennon, mas que nunca aconteceu. Nos anos seguintes, ele acabou lançando mais alguns discos – “Mind Games” (1973), “Walls And Bridges” (1974), “Rock ‘n’ Roll” (1975) –, se separou e voltou para os braços de Yoko.

John também viu seu segundo filho, Sean, nascer no mesmo 9 de outubro que o pai, e passou a segunda metade da década de 1970 em casa fazendo pão, cuidando de Sean, vendo sombras na parede e as rodas giragem enquanto compunha, sem pressa, novas canções para “Double Fantasy”, lançado em novembro de 1980, poucos dias antes de seu assassinato.

A histórica tarde-noite no Madison Square Garden, em 30 de agosto de 1972, mostra o brilho e a alma de Lennon. O show saiu em LP, em fevereiro de 1986. Alguns anos depois, ganhou edição em CD e DVD. Felizmente, é possível encontrar “One to One” na íntegra no YouTube. Foi a última vez que John e Yoko pisaram juntos em um palco. Foi, também, o último show de John Lennon.

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