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Férias e chuvas: Riscos geológicos são perigo em atrações naturais de Minas

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As chuvas fortes nos meses de dezembro e janeiro aliadas ao período de férias acendem um alerta quanto aos perigos geológicos em atrativos naturais de Minas Gerais. As informações são do jornal O Tempo.

Em julho deste ano, uma pesquisa do Serviço Geológico do Brasil (SGB) identificou riscos como queda de barreiras, enxurradas e rolamento de rochas em 18 das 21 atrações turísticas do parque que fica entre as cidades de São Roque de Minas e Delfinópolis, no Centro-Oeste de Minas.

Já no Parque Estadual do Ibitipoca, na cidade de Lima Duarte, na Zona da Mata do Estado, uma placa com a frase: “você é responsável por sua segurança”, preocupa os visitantes. Aliás, foi justamente no mês de janeiro de 2022 que uma rocha desabou e matou dez pessoas no cânion de Capitólio, no Sul de Minas Gerais.

Na Serra do Canastra parte de duas cachoeiras foram interditadas em períodos de chuvas intensas, que incluem os meses de dezembro e janeiro, após os apontamentos feitos pelo estudo geológico. Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que é responsável pela administração do parque, além das interdições é estudada a colocação de barreiras de segurança no local.

“No Poço Fundo, a trilha entre as partes baixa e alta da cachoeira Casca D’anta e parte do acesso à cachoeira do Rolim foram interditadas. A equipe do parque também estuda a possibilidade da inclusão de barreiras de segurança em alguns locais”, diz o ICMBio por nota.

Dentro da área verde, um total de quinze cachoeiras apresentam riscos de deslizamento de solo, queda, tombamento e rolamento de blocos rochosos, além de enxurradas. Em quase todas elas esses problemas estão em um nível de risco alto. Além disso, há no parque também trilhas, nascentes e poços que apresentam os mesmos problemas com os riscos variando de baixo até o mais alto.

Apesar dos perigos e dos riscos, o próprio estudo afirma que não há necessidade de interdição total do parque, mas é preciso manter as informações e evitar os locais que apresentam perigo. “A eventual identificação de perigo não impossibilita a atividade turística nestes locais, entretanto exige práticas seguras que orientem gestores e visitantes quanto aos cuidados para acessibilidade e permanência nas proximidades das áreas com potencial de ocorrência de processos geológicos/hidrológicos”, alerta.

Segundo o ICMbio, foram instaladas placas informativas no Parque Nacional da Serra da Canastra sobre os perigos nos locais identificados pelo estudo para que as pessoas não fiquem próximas aos pontos de riscos de desmoronamentos. Outra medida tomada foi a de orientar os funcionários das portarias da Unidade de Conservação Federal e demais prestadores de serviços para repassarem as informações de segurança aos visitantes.

O chefe de gabinete da prefeitura de São Roque de Minas,  Valmório Lima Junior, conta que apesar das chuvas, nesses meses de dezembro e janeiro são recebidos muitos turistas na cidade. Para evitar que ocorram acidentes, a prefeitura também está atuando junto ao ICMBio. “Estamos fazendo reuniões entre as defesas civis municipais de São Roque e Delfinópolis e também a Defesa Civil Estadual para discutirmos as medidas de segurança. Além disso, fizemos reuniões com guias turísticos da cidade para que eles sejam informados de todos os locais de risco, são divulgadas informações para as pousadas passarem para os turistas e estamos passando informações em nossas redes sociais também”, destaca.

Segundo ele, apesar de ser um período chuvoso e de haver necessidade de cuidado nessas atrações naturais, não há motivo para pânico e os locais podem ser visitados normalmente com todas as informações de segurança. “Não significa que as pedras vão sair despencando. O estudo mostra os locais a serem evitados, então os guias vão orientar os turistas a não subirem em determinado ponto, não ficar debaixo de certas pedras, não parar em locais onde os rios e cachoeiras podem encher. O importante é ter a conscientização, mas essas atrações são espaços muito bonitos que devem ser aproveitados pela sociedade sim, basta tomar todos os cuidados”, enfatiza.

“Você é responsável por sua segurança”

No Parque Estadual do Ibitipoca, em Lima Duarte, na Zona da Mata, a preocupação em relação a acidentes dos mais diferentes tipos também marca presença. A placa que diz “você é responsável por sua segurança” pode até servir como alerta, mas, segundo o engenheiro ambiental e coordenador do Núcleo de Análise Geoambiental (Nagea) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Cézar Barra, faltam ações para mostrar aos turistas as precauções que devem ser tomadas em meio às trilhas perigosas, riscos de quedas e de picadas de cobra, por exemplo.

“Por vezes, os turistas estão distraídos, contemplando a paisagem, tirando fotos, sentados bem próximos aos paredões, que podem se soltar. Certa vez, um deles contou, achando engraçado, que viu uma jararaca”, diz ele, que estuda o local desde 2005.

Os avisos mais incisivos, segundo Barra, seriam importantes diante de diversos perigos – nem tão escondidos – no parque. Ele conta, por exemplo, que a geologia do local é bem parecida com a de Capitólio, no Centro-Oeste do Estado, onde no mês de janeiro um paredão caiu sobre uma lancha, matando dez pessoas. “Blocos de quartzito podem se soltar, como ocorreu em Capitólio. As ações do vento e da água vão colaborando para uma placa se soltar da outra”, diz ele.

Segundo Barra, diante desse cenário, um mapeamento de risco no Parque do Ibitipoca deveria ser feito com frequência, para evitar esse tipo de tragédia. Se possível, mensalmente. O que, conforme ele aponta, não acontece. “As placas vão dando sinais, e é importante observá-los. Elas podem se desprender e surpreender os turistas”, alerta ele.

Esse, porém, não é o único risco apontado pelo especialista em relação ao parque. Conforme ele afirma, as trilhas também escondem perigos. Um deles é o de picada de cobra, animais muito comuns por aquele local. A isso, soma-se a ausência de soro antiofídico no município de Lima Duarte, usado para tratamento desses casos. O produto só é encontrado no Pronto Socorro de Juiz de Fora, aumentando os percalços de quem precisa de socorro.

Os turistas, diz ele, também não são orientados a usarem botas adequadas para adentrar os locais, o que contribui para aumentar os riscos de picadas de bicho. Ninguém avisa ainda, conforme ele ressalta, sobre a necessidade de levar água para se hidratar nas longas caminhadas pelo parque e dos riscos relacionados à desidratação. E isso não é tudo, diz ele. Se alguém passa mal ou sofre um acidente, dificilmente será socorrido com a agilidade que a situação talvez exija.

“O sistema de comunicação no parque é muito ruim. Não tem um sistema de comunicação no caso de acidente. Se a pessoa está longe e tem um mal súbito, o que vai fazer? Há vários locais mais afastados e, se o turista estiver ali e se acidentar, vai ter que contar com a sorte. Não tem um guarda-parque, por exemplo, para chamar socorro rapidamente. Um carro não pode ir correndo, pois a estrada é ruim. Se for moto, é difícil colocar a pessoa no veículo. Pode-se, ainda, precisar de maca. Conheço casos de pessoas que se machucaram e que tiveram de voltar carregadas por outras”, diz ele.

Segundo Barra, seria importante que o parque implementasse câmeras que pudessem mostrar turistas que, porventura, estejam em alguma situação de dificuldades. Para ele, um sistema de segurança com rádio, vigilância, com alguém para se recorrer em caso de acidente é essencial. “Os acidentes, muitas vezes, são tratados de maneira bem amadora”, conclui.

A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) questionando os riscos em relação ao parque, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. A Prefeitura de Lima Duarte também foi acionada e questionada em relação ao soro antiofídico e também não se pronunciou.

Proibir tudo não é solução, diz especialista

O professor aposentado do Instituto de Geociência da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Allaoua Saadi, considera que proibir o acesso aos pontos turísticos não é uma solução inteligente para o problema. “Proibir tudo não é fazer uma boa gestão territorial. É importante que as pessoas continuem a usar os atrativos naturais com segurança. Cabe aos órgãos responsáveis e aos gestores desses parques fazerem estudos geológicos e disponibilizar as informações para a população. Tem acidentes que são altamente previsíveis. É importante informar os locais onde as pessoas não devem transitar e solucionar os problemas possíveis”, enfatiza.

Segundo ele, a proibição só deve ser feita em último caso. “Se o espaço todo tiver a necessidade de ser interditado por causa de risco iminente aí sim se deve fazer e tentar solucionar o problema para trazer segurança. Hoje em dia temos várias soluções no mundo para esses problemas geológicos” complementa.

Veja as atrações do parque da Serra do Canastra e os problemas encontrados pelo estudo

Cachoeira da Casca D’Anta – Parte Alta (Poço Fundo): queda, tombamento de bloco rochoso e enxurrada.

Cachoeira da Casca D’Anta – Parte Baixa: queda, tombamento e rolamento de bloco rochoso; enxurrada.

Trilha Difícil: deslizamento de solo, queda e rolamento de bloco rochoso .

Trilha Saint-Hilaire: deslizamento de solo, queda e rolamento de bloco rochoso.

Poço da Trilha Saint-Hilaire: enxurrada.

Cachoeira do Fundão: queda, tombamento e rolamento de bloco rochoso,  enxurrada.

Cachoeira da Mata: queda de bloco rochoso e enxurrada.

Cachoeira Triângulo: queda e rolamento de bloco rochoso e enxurrada.

Cachoeira Vai Quem Pode: queda de bloco rochosos e enxurrada.

Cachoeira das Borboletas: queda e rolamento de bloco rochoso e enxurrada.

Cachoeira dos Lambaris: enxurrada.

Cachoeira Coqueirinhos: queda e rolamento de bloco rochoso e enxurrada.

Alto Cachoeira do Sofazinho: enxurrada e queda de bloco rochosos.

Cachoeira Paraíso: enxurrada.

Cachoeira Paraíso II: enxurrada.

Nascente do Rio São Francisco: enxurrada.

Cachoeira Rasga Canga: enxurrada e queda e rolamento de bloco rochoso.

Cachoeira dos Rolinhos e Poço: enxurrada e queda e rolamento de bloco rochoso.

Cachoeira da Ana e Poço Raso: enxurrada.

Trilha do Cerrado: queda de blocos rochosos.

Curral de Pedras: queda de blocos rochosos.

 

Foto: Cachoeira do fundão – Edy Fernandes/Divulgação

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