Abuso Sexual

‘Estupro culposo’; entenda o termo utilizado na repercussão do caso Mari Ferrer

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O caso da jovem Mariana Ferrer, que alega ter sido estuprada em um beach club em Florianópolis pelo empresário André Aranha, tomou conta das redes sociais na última terça-feira, 03 de novembro.
Durante julgamento, a defesa do acusado e o Ministério Público alegaram que o homem não sabia que a vítima não estava com a sua capacidade plena de consentir.
O termo “estupro culposo” acabou se tornando o assunto mais comentado em todas as redes sociais. Mas afinal, o que é isso? O Estado de Minas conversou com duas advogadas que explicaram o uso do termo e o caso Mari Ferrer.
Segundo as advogadas e fundadoras da página “Me Conta Direito”, Fernanda de Ávila e Silva, 37 anos, e Dhainna Leonardi, 30 anos, a defesa alegou que André não teve a intenção de estuprar, o que significa um erro essencial de tipo. Ou seja, quando o acusado não sabia que a capacidade da vítima de dar consentimento estava prejudicada.

“Em nenhum momento, é citado o estupro culposo, esse foi um termo utilizado pela mídia. Até porque não existe estupro culposo. Ele acabou sendo absolvido”, explica Fernanda.

Elas explicam que um o erro essencial de tipo acontece quando o acusado se equivoca com relação à algum elemento que configura o crime. No caso, a defesa de Aranha disse que ele errou ao se equivocar sobre a capacidade dela de dar consentimento. Segundo elas, como não há modalidade culposa no crime de estupro, o Ministério Público e a defesa pediram que ele fosse absolvido.
“Existe o dolo e existe a culpa. O dolo é a intenção de fazer alguma coisa. A culpa acontece quando você não tem intenção e faz mesmo assim. Eles entenderam que não houve dolo e, sem o dolo, não há crime de estupro”, afirmam.
As advogadas também dizem que, apesar de o Ministério Público pedir anteriormente a condenação de Aranha, isso mudou após a entrada do promotor Thiago Carriço de Oliveira. Ele pediu a absolvição do réu, porque segundo ele, houve erro essencial de tipo.
Elas ainda explicam que Mari pode recorrer da decisão na segunda instância. “Como advogada, acredito que vá depender muito de quem será o advogado dela e de quem será o colegiado, mas acredito que o impacto da audiência vazada possa ajudar nesse caso. Fica evidente que ela foi humilhada”, diz Fernanda.

Humilhação

Imagens divulgadas pelo The Intercept Brasil nesta terça-feira (3) mostram o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho humilhando Mari Ferrer durante o julgamento. No vídeo, ele diz que ‘jamais teria uma filha do nível dela’ e insinua que as roupas e fotos de Mari são provocativas, tentando responsabilizá-la pelo estupro.
Segundo as advogadas, Gastão da Rosa Filho agiu “muito mal”. “Ele humilha a Mariana e usa coisas que não têm absolutamente nada a ver com o processo. O advogado pode usar tudo que ele tem, até porque o acusado tem seu direito de defesa, mas existe um limite. Você não pode ofender a vítima para defender seu cliente. É antiético.”
Apesar disso, Fernanda e Dhainna explicam que o advogado não cometeu nenhum crime, por ter imunidade profissional. Segundo o artigo 142 do Código Penal, não constituem injúria ou difamação punível quando “a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador”.
“Não é crime, não constitui injúria e difamação ele ofender alguém por conta de uma discussão acalorada, mas isso não impede que ele responda por uma infração administrativa. Acho importante a gente até mesmo refletir. Nesse caso, ele sai completamente do contexto.”
ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), publicou uma mensagem em seu perfil no Twitter pedindo que órgãos de correção investiguem postura dos agentes envolvidos no julgamento da acusação de estupro. O magistrado classificou como ‘estarrecedoras’ as imagens da audiência.

“O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, publicou o ministro.

Defesa recorre

Após a Justiça de Santa Catarina inocentar o empresário André Aranha, a defesa da vítima recorreu da decisão do juiz Rudson Marcos, da 3ª Vara Criminal de Florianópolis.

O advogado de Mariana Ferrer, Júlio César F. da Fonseca, afirmou que a vítima já entrou com recurso
, que foi aceito pelo juiz e encaminhado para o Tribunal da Justiça de Santa Catarina (TJSC) que vai reapreciar o caso.

O processo voltou a correr em sigilo de Justiça.

Denúncia contra Rudson Marcos

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai analisar um pedido de investigação contra o juiz. Isso porque, durante audiência de instrução e julgamento do processo, o magistrado não interveio quando o advogado do acusado  afirmou que a jovem tem como “ganha pão” a “desgraça dos outros”, nem quando foram mostradas fotos sensuais da garota, sem qualquer relação com o fato apurado, para questionar a acusação.
O pedido de investigação contra o juiz foi apresentado pelo conselheiro do CNJ Henrique Ávila à corregedoria do órgão.

Ministério da Mulher

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) manifestou atráves de nota de repúdio.
“O MMFDH informa que acompanha o caso e que, quando a sentença em primeira instância foi proferida, em setembro, a Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres (SNPM) manifestou-se questionando a decisão, com envio de ofícios ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ao Conselho Nacional do Ministério Público, à Corregedora-Geral de Justiça, à Ordem de Advogados do Brasil (OAB) e ao Corregedor-Geral do Ministério Público de Santa Catarina.”
Segundo a nota, o Ministério manifesta-se contra a utilização do termo “estupro culposo” e afirma que acompanhará recurso já interposto pela denunciante em segundo grau, confiando nas instâncias superiores.

Caso Mari Ferrer

A hashtag #JUSTIÇAPORMARIFERRER é utilizada pelos seguidores da jovem para mostrar indignação sobre o caso

 

Após ser estuprada, a vida da modelo Mariana Ferrer mudou completamente. A jovem, que tinha 21 anos na época do crime, começou a utilizar as redes sociais para contar os acontecimentos. Apontando erros na investigação e pedindo justiça, Mari foi acolhida pelos internautas, que juntos a ela começaram a cobrar respostas.

O caso ocorreu em dezembro de 2018 e ganhou atenção a partir da divulgação de Mariana, sem esperança com o sistema judiciário para punir seu agressor devido à sua posição na sociedade.

A hashtag #JUSTIÇAPORMARIFERRER é utilizada pelos seguidores da jovem para mostrar indignação sobre o caso.

A modelo usava seu perfil no Instagram para fazer denúncias. “15 de dezembro de 2018, Florianópolis, Santa Catarina. Não é nada fácil ter que vir aqui relatar isso. Minha virgindade foi roubada de mim junto com meus sonhos. Fui dopada e estuprada por um estranho em um beach club dito seguro e bem conceituado da cidade”, relatou ela, na época.
O acusado, André Aranha, 43 anos, é filho do advogado que representou a TV Globo, Luiz de Camargo Aranha, e já foi fotografado ao lado de Gabriel Jesus, Ronaldo Nazário e Roberto Marinho Neto.
Ele foi indiciado pela Polícia Civil em 2019 por estupro de vulnerável e o processo segue em andamento. Os exames provaram que houve conjunção carnal, ou seja, introdução completa ou incompleta do pênis na vagina, ruptura do hímen de Mariana e ainda identificaram sêmen dele em sua calcinha – apesar de André ter afirmado que nunca teve contato físico com ela.
Apesar disso, em setembro deste ano, o juiz Rudson Marcos absolveu o empresário da acusação de estupro de vulnerável da influenciadora.
Durante o julgamento, o promotor responsável pelo caso afirmou que não havia como o empresário saber, durante o ato sexual, que a jovem não estava em condições de consentir a relação.
Fonte: por Ana Mendonça –  EM

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