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Saúde

Estudo alerta para necessidade de ação contra crise global de depressão

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Embora seja uma doença tratável, a depressão vem, ano a ano, crescendo de forma exponencial e a nível global. Hoje, pelo menos 5% da população adulta de todo o planeta sofre com esse mal. E, em países de baixa renda, como o Brasil, até 80% das pessoas afetadas pela enfermidade não iniciaram tratamento e nem sequer receberam diagnóstico. E, mesmo em nações ricas, a negligência em relação à descoberta e ao acompanhamento médico adequado compromete o quadro de saúde de quase metade dos que têm a condição.  As informações são do jornal O Tempo.

Estas são algumas conclusões de um estudo publicado, no mês passado, na revista científica “The Lancet”. O documento – assinado por 25 pesquisadores de 11 países e de diferentes áreas de atuação, da psiquiatria à neurociência – alerta a comunidade global para uma crise depressiva e para a necessidade de ações urgentes para combater esse mal, que continua cercado de estigmas. Para os autores, é necessário um esforço conjunto de governantes, prestadores de cuidados de saúde, estudiosos, pacientes e seus familiares para o efetivo enfrentamento do problema de saúde pública.

“Investir na redução do fardo da depressão dará a milhões de pessoas a chance de se tornarem membros mais saudáveis, felizes e produtivos da sociedade, ajudará a fortalecer as economias nacionais e a avançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas para 2030”, argumenta, em comunicado, Helen Herrman, presidente da comissão Tempo para uma Ação Unida Sobre a Depressão, responsável pela elaboração do relatório.

“Indiscutivelmente, não há outra condição de saúde que seja tão comum, tão onerosa, tão universal ou tão tratável quanto à depressão, mas que recebe pouca atenção política e recursos”, acrescenta, por meio de nota, o psiquiatra Christian Kieling, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e um dos autores do artigo. Ele ainda alerta que a dificuldade de acesso a serviços de saúde e o preconceito se impõem como obstáculos ao enfrentamento da crise global da enfermidade. “Tratamentos psicossociais e médicos eficazes são de difícil acesso, enquanto altos níveis de estigma ainda impedem muitas pessoas, principalmente adolescentes e jovens em risco ou experimentando depressão, de buscar a ajuda necessária para ter uma vida saudável e produtiva”, pontua.

O psiquiatra Bruno Brandão reforça que o não tratamento da depressão traz, para as pessoas enfermas e para a sociedade em geral, diversas e graves implicações. Na pior das hipóteses, o quadro pode levar ao suicídio.

“Em termos de senso comum, imaginamos que o sofrimento será o único prejuízo acarretado a uma pessoa deprimida. De fato, esses pacientes experimentam grande carga de sofrimento, que aparece de forma muito intensa. Mas há também perdas em outras esferas da vida. Do ponto de vista social, pode haver o isolamento. No ambiente profissional, perda de rendimento e demissão. Em termos de relacionamentos, rompimentos”, avalia.

“E há também outro desdobramento que é pouco falado: os impactos para a saúde física, com aumento do risco de desenvolvimento de diabetes e de hipertensão arterial, além de a doença ser fator para o aparecimento de alguns tipos de câncer – lembrando ainda que a depressão interfere negativamente no tratamento dessas enfermidades, sendo mais difícil para o sujeito deprimido controlar a pressão ou aderir à quimioterapia, por exemplo”, alerta, concluindo que os reflexos são sistêmicos e que o não tratamento torna o problema ainda maior.

Brandão lembra que a depressão não tem uma única causa e está associada a uma série de fatores de risco. “Sabemos que o transtorno tem componentes genético, ambiental e psicológico. Por exemplo, doenças crônicas, como no caso de dores crônicas, ampliam a probabilidade de quadros depressivos, assim como traumas, sobretudo na infância e na adolescência. Ter familiares de primeiro grau com diagnóstico também é algo que amplia as chances de ocorrência, podendo haver herança genética para este mal. A baixa autoestima e o uso abusivo de álcool e de outras drogas são outros fatores de risco a serem considerados”, enumera. Ele lembra que episódios depressivos não tratados tendem a retornar. “Então, se a pessoa já teve a doença, há risco de reincidência, principalmente se não tiver havido tratamento adequado”, diz.

Ao falar sobre a importância de se buscar ajuda profissional para o enfrentamento da depressão, o especialista cita sintomas que não devem ser negligenciados. “O humor deprimido e a diminuição do interesse e do prazer em atividades que a pessoa gostava de realizar são sinais que devem ser considerados. Alteração do peso, seja com ganho ou perda de gordura, e mudanças em relação à rotina de sono, seja com sonolência constante ou insônia, também devem fazer soar um alerta. Por fim, é comum o relato de pacientes depressivos que descrevem alterações psicomotoras, ficando mais agitadas ou mais lentas, sensação de cansaço, de inutilidade e de culpa, além de problemas de concentração e de memorização. Pensamentos de morte, as chamadas ideações suicidas, também são sinais comuns de quadros depressivos”, examina Brandão.

Ele lembra que, para configurar depressão, esses sintomas precisam ser intensos e não ser passageiros. “Uma pessoa que está em um dia ruim, que terminou uma relação ou que tenha sido demitida, por exemplo, pode se sentir mal por um tempo apenas por estar triste naquele momento”, pondera, lembrando que o diagnóstico da doença deve ser feito por profissionais capacitados.

Agrava o problema o fato de ainda haver muito preconceito em relação a pacientes deprimidos. “Infelizmente a gente tende a negar aquilo que a gente não vê. Se tenho hipertensão arterial, consigo aferir por meio de medição. Se tenho diabetes, consigo checar por meio de exames. Por outro lado, a depressão, como outros transtornos psicológicos e psiquiátricos, é invisível, não podendo ser medida por um equipamento ou por meio de exames de imagem ou de laboratório. E isso faz que haja desconfiança”, comenta. “Essa dificuldade de entender o quadro faz que muitos pensem que o sujeito deprimido está apenas querendo chamar atenção ou que, para melhorar, basta que ele tenha boa vontade, como se pudesse mudar o seu estado de humor em um estalar de dedos”, prossegue, citando que muitos pacientes chegam a se culpar por ter a doença.

“Essas pessoas começam a acreditar que elas são mesmo fracas, passam a crer que estão mesmo se vitimizando. Por isso, algumas deixam de buscar tratamento, pois sentem vergonha de pedir ajuda”, diz, detalhando que, muitas vezes, o tratamento começa por essa compreensão de que o doente não é culpado pelo próprio quadro de saúde. “Para superar esses estigmas, só há um caminho: a informação”, diz Brandão. Para ele, além do esforço conjunto de governantes, prestadores de cuidados de saúde, estudiosos, pacientes e seus familiares, é preciso que a mídia de maneira geral também aja no sentido de desmistificar a depressão por meio de campanhas de conscientização.

Prevenção. Embora não exista fórmula mágica ou garantia de imunidade a quadros depressivos, Bruno Brandão sustenta que existem algumas atitudes que vão reduzir de maneira considerável as chances de ocorrência da doença. “Para começar, devemos buscar ter hábitos de vida mais saudáveis, realizando atividades físicas, seguindo uma dieta equilibrada e tendo noites de sono bem dormidas. Não fazer uso abusivo de álcool e outras drogas também ajuda. Por fim, ter uma atitude positiva é também recomendável, uma vez que nutrir um olhar muito pessimista para a vida é um fator de risco para a depressão”, situa.

O psiquiatra ainda lembra que outros aspectos que potencializam as chances de manifestação da enfermidade, como a baixa autoestima, podem ser tratados preventivamente por meio da psicoterapia.

Tratamento. “Em geral, a depressão vai ser tratada com medicamentos e/ou psicoterapia. Isto é, episódios leves e, às vezes, moderados, podem ser tratados apenas com psicoterapia. Os mais graves exigem medicação. Contudo, em geral, os melhores resultados são alcançados quando o paciente combina as duas modalidades de tratamento”, destaca Brandão.

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