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Contrato de R$ 3,8 milhões entre laboratório e prefeitura é alvo de investigação da CPI

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Secretaria indica que despesa poderia ser maior caso fossem contratados servidores para serviço ser prestado pelo laboratório municipal

Em agosto de 2017, a Prefeitura divulgou um edital para a contratação de um laboratório de análises clínicas visando atender as necessidades da secretaria municipal de saúde e UPA de Nova Serrana.

A licitação foi vencida pelo Laboratório Nova Serrana Ltda., que ao contrário do que se pratica em diversos municípios mineiros, estabeleceu valores muito superiores a Tabela SUS, mantendo um contrato anual de R$ 3.800.000,00 (Três milhões e oitocentos mil reais) com o Município.

Diante disso, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) instaurou o Inquérito Civil nº 0452.18.000053-4, com o objetivo de se apurar “eventual irregularidade no Processo Licitatório nº 152/2017 e Pregão Presencial nº 076/2017, por meio dos quais o Município de Nova Serrana contratou os serviços do Laboratório Nova Serrana Ltda.”

A reportagem deste Popular participou da oitiva da senhora Iara Francisca Alves Rodrigues Chaves perante a CPI que investiga os Contratos Públicos estabelecidos no âmbito da saúde para trazer com exclusividade a matéria, inclusive com partes dos depoimentos do envolvidos, que já prestaram esclarecimentos ao Ministério Público.

A denúncia formulada junto ao Ministério Público envolve suposto direcionamento do processo licitatório, superfaturamento de preços e troca de favor político.

Fiscalização do legislativo

O vereador Professor Willian Barcelos (PTB) concedeu entrevista à nossa redação, e num primeiro momento, informou que esse caso tem sido tratado com discrição, apesar das audiências da Comissão ser públicas e abertas a todo e qualquer cidadão.

Em relação as denúncias de direcionamento e superfaturamento, o parlamentar disse que existe uma diferença conceitual e jurídica em relação ao termo superfaturamento e que, portanto, trabalha na tese do sobre-preço.

Mais difícil de ser comprovado, mas cujo trabalho da CPI tem evoluído muito neste sentido. Também há fortes indícios de direcionamento. Inclusive, os sócios da empresa Laboratório Nova Serrana Ltda. figuram entre os principais doadores de campanha do prefeito Euzébio Rodrigues Lago, em 2016.

Além disso, a sócia-administradora do laboratório, Iara Francisca Alves Rodrigues Chaves seria casada com outro doador de campanha, Gabriel Rodrigues Chaves, melhor amigo de Euzébio Rodrigues Lago e vice-presidente do MDB, partido que tem o atual prefeito como presidente.

Credenciamento versus Pregão Presencial

Com base na Lei Orgânica do SUS, o vereador Professor Willian Barcelos (PTB) esclareceu que iniciativa privada pode participar do SUS apenas em caráter complementar, mediante contrato ou convênio, observadas as normas de direito público, em especial a Lei 8.666/1993.

A participação da iniciativa privada no sistema de forma complementar significa dizer que os gestores devem, prioritariamente, promover as ações e serviços de saúde, os quais devem ser prestados por órgãos e instituições públicas da Administração direta e indireta das três esferas governamentais, para somente então, em razão de insuficiência dos serviços públicos, recorrer a entidades privadas.

Contudo, Ministério Público Federal, em sede da Recomendação nº 12/2015-PR/AP, exarada nos autos do Inquérito Civil Público nº 1.12.000.000280/2013-11, considerou que a forma de se promover a participação de entidades do setor privado no SUS é o credenciamento, sendo que as entidades podem ser tanto as com fins lucrativos, quanto as filantrópicas e as sem fins lucrativos, com preferência para as duas últimas (artigo 199 da Constituição federal e artigo 25, Lei n.º 8.080/1990).

Ainda conforme entendimento do Ministério Público Federal, o credenciamento pode ser processado tanto por meio de licitação, quanto por inexigibilidade de licitação (artigo 25 da Lei n.º 8.666/1993), sendo que a inexigibilidade, a priori, atenderia de forma mais eficiente às necessidades de contratação, visto que é interesse público contratar tantos prestadores quantos demostrarem interesse na prestação dos serviços nas condições e a preços definidos pelo poder público contratante, o que caracteriza a inviabilidade de disputa, já que a contratação de um interessado não exclui a dos outros.

Denúncia anônima

Os autos do Inquérito Civil nº MPMG-0452.18.000053-4 indicam que Gabriel Rodrigues Chaves, o Laboratório Nova Serrana Ltda e a Prefeitura Municipal são investigados por direcionamento de processo licitatório, superfaturamento de preços e favorecimento político.

O curioso é que a investigação foi desencadeada, assim como naquela que culminou na Operação Kobold, responsável pelo afastamento de seis parlamentares de Nova Serrana, a partir de uma denúncia anônima.

A denúncia foi formulada em novembro de 2017 e traz os seguintes dizeres: “A prefeitura fez uma licitação, carta marcada, e contratou o Laboratório Nova Serrana Ltda, que obteve informações privilegiadas da secretaria de saúde do município, para serviços de exames de laboratório no valor de R$ 3.800.000,00. A licitação está toda ilegal, com erros e vícios, orçamentos e planilhas superfaturados, não foi publicada corretamente e lote único. Todas as licitações anteriores do mesmo gênero foram por chamamento público, só esta foi por pregão. As irregularidades afastaram os concorrentes. Foi dada preferência para esta empresa porque ela é da mulher do Gabriel Chaves, funcionário da Câmara e melhor amigo do prefeito, como ele disse no dia da sua posse. Todos acreditam na impunidade do país. Gabriel como não recebeu para trabalhar na campanha do ‘amigão’ Euzébio, recebeu como forma de pagamento um contrato milionário e um cargo na Câmara, ´êta amizade’ boa””.

Laudo Técnico do Ministério Público

A ex-promotora de justiça, Dra. Vanessa Aparecida Gomes, solicitou da CEAT (Central de Apoio Técnico) do Ministério Público de Minas Gerais “a elaboração de laudo técnico, com o escopo de aferir a ocorrência de irregularidades, direcionamento ou de superfaturamento no processo licitatório nº 152/2017”.

A referida perícia foi finalizada em 30/01/2019, sendo que a analista responsável verificou, somente nos primeiros três meses de contrato, a efetivação de 16.571 exames, ao custo de R$ 228.000,00.

Segundo ela, caso o Município de Nova Serrana tivesse contratado tais exames pelo modelo de Credenciamento, o valor teria sido bem inferior. Pela mesma forma que usualmente os municípios mineiros realizam esse tipo de aquisição, com base na Tabela SUS, os mesmos exames custariam apenas R$ 82.825,03, uma diferença de R$ 145.174,97 em relação aos R$ 228.000,00 que foram pagos pela Prefeitura.

Questionado sobre o parecer do Ministério Público, o relator da CPI diz que não se trata de um documento elucidativo quanto ao direcionamento ou superfaturamento. “O que é compreensível, pois se trata de uma análise de cunho predominantemente contábil. Mesmo assim, a perícia revela, no mínimo, a má gestão do recurso público”. Concluiu Barcelos.

Nova forma de contratação

Em seu depoimento perante a CPI, a responsável pelo Laboratório Nova Serrana Ltda disse que entre os exames mais realizados para a UPA estariam “hemograma, ureia, creatinina, PCR, PHS, urina rotina, gram, glicose e tramponina”. Já os exames eletivos, requeridos pela secretaria municipal de saúde, destacaram-se: “toxoplasmose, PSA, rubéola, GGGM e urocultura”.

A equipe de redação do Popular teve acesso ao Inquérito Civil, e estando presente na reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara Municipal de Nova Serrana, conseguiu elaborar uma planilha com o comparativo de preços estabelecido no contrato com o Laboratório Nova Serrana e a Tabela SUS. Para os exames mais realizados, conforme depoimento da senhora Iara Francisca Alves Rodrigues Chaves, chegamos a seguinte variação:

 

DESCRIÇÃO DE SEVIÇOS / EXAMES

 

Contrato

 

Tabela SUS

 

Sobrepreço

Creatinina 8,00 1,85 332,43%
Glicose 8,00 1,85 332,43%
Gram de gota 9,00 2,80 221,43%
Proteína C reativa-PCR 11,00 2,83 288,69%
Troponina 35,00 9,00 288,89%
Ureia 8,00 1,85 332,43%
Urina Rotina 8,00 2,04 292,16%
Urocultura com Antibiograma 29,00 4,98 482,33%
Rubeola – anticorpos IGG 20,00 17,16 16,55%
Rubeola – anticorpos IGM 24,00 17,16 39,86%
Toxoplasmose IGG 20,00 16,97 17,85%
Toxoplasmose IGM 23,00 18,55 23,99%
PSA Livre/Total 29,00 16,42 76,61%
PSA Total/Ultrasensível 25,00 16,42 52,25%

 

Dessa forma, a relação de exames mais solicitados e contratados pela Prefeitura demonstra uma variação ou sobrepreço de até 482,33%. Conforme aponta o vereador Professor Willian Barcelos (PTB), a Prefeitura Municipal de Nova Serrana realizou no início deste ano, quando as investigações já estavam em curso, a mudança de sistema de contratação, adotando o chamado credenciamento.

“Pelo novo modelo, os custos caíram drasticamente. Vários laboratórios foram habilitados, entre eles, o próprio Laboratório Nova Serrana. Todos estão contratando com a secretaria municipal de saúde pelo preço da tabela SUS. Isso comprova de modo cabal que o dinheiro dos exames escorreu pelo ralo. Não se trata de acusação leviana, mas de realidade comprovada e documentada”. Finalizou Barcelos.

Executivo se posiciona

No inquérito o prefeito de Nova Serrana foi ouvido e ponderou suas devidas considerações ao Ministério Público. Nossa reportagem por sua vez fez contato com o chefe do executivo que encaminhou nossa equipe para a secretária Municipal de Saúde, Glaucia Sbampato que fez considerações técnicas e administrativas quanto a licitação em questão.

Segundo Glaucia a forma como foi feito o processo licitatório se deve pelo fato de que, quando feito o processo de credenciamento, os procedimentos eletivos são preenchidos pelas empresas locais, contudo, como era necessário a prestação de serviço nos plantões da Unidade de Pronto Atendimento, era inexistente as empresas que se interessavam em prestar o serviço.

Assim sendo a contratação da prestação de serviços foi feito em um montante, tendo então uma empresa interessada no procedimento, e ainda “é importante ressaltar que esse processo de contratação nesse formato sempre foi feito desta forma em Nova Serrana, desde as gestões anteriores esse processo é realizado no mesmo formato”. Considerou.

Quanto ao valor do serviço a secretária ressaltou “que quando é colocado o caráter de urgência nos procedimentos se tem automaticamente um aumento no valor do procedimento, isso porque ele ocorre 24 horas por dia, todos os dias da semana”.

Ainda quanto aos valores Sbampato ressaltou que “se fossemos montar a estrutura própria no laboratório municipal para atendimento ao processo o custo seria muito mais alto. Teríamos que contratar mais seis bioquímicos e seis técnicos, e ainda teríamos os encargos trabalhistas e os custos de insumos, o que tornaria o processo muito mais caro”. Apontou a secretária.

Finalizando Glaucia ainda explicou que “com a OS assumindo a administração compartilhada da UPA, esse custo reduziu, isso porque a empresa conseguiu contratar um laboratório de Belo Horizonte que montou sua estrutura aqui em Nova Serrana e passou a prestar o serviço com um valor que nenhum laboratório aqui da cidade quis prestar o serviço, esse foi um dos ganhos quanto a economia que a gestão compartilhada da UPA trouxe para o municípios”, finalizou a secretária.

Nossa reportagem teve ainda contato com o setor de RH da prefeitura de Nova Serrana por intermédio da secretária e fomos informados que um Bioquímico com carga horaria de 40 h recebe mensalmente honorários na ordem de R$ 3.430,00, já os técnicos recebem pela mesma carga horária R$ 1399,00, e ainda cada servidor recebe o adicional de insalubridade de aproximadamente R$199,00.

Caso fosse montado a estrutura pontuada pela secretária o município teria anualmente uma despesa de aproximadamente R$ 407 mil, sem contar os insumos.

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