Minas
Cadeias: 34% das prisões de Minas estão parcial ou totalmente interditadas
Minas Gerais tem 34% dos presídios e penitenciárias interditados. Mesmo assim, as unidades seguem operando normalmente. As informações são do jornal O Tempo.
O número sinaliza, conforme análise de especialista na área, a necessidade de repensar os motivos das prisões, além de uma urgência da administração estadual na elaboração de um plano que tenha o objetivo de conservar as unidades prisionais. As condições “insalubres” tanto para custodiados quanto para servidores são motivos de denúncias recebidas pelo Poder Judiciário – responsável por interditar os presídios.
Na região metropolitana de Belo Horizonte, sete das dez unidades prisionais estão total ou parcialmente interditadas pela Justiça. A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) explica que, quando ocorre, por exemplo, a interdição total, não significa que acontecerá o fechamento da unidade por completo.
“As unidades interditadas totalmente apenas deixam de receber custodiados, mas continuam operando normalmente, até que se chegue à lotação determinada pelo Poder Judiciário da comarca”, afirmou a pasta em nota a O TEMPO. De acordo com a Sejusp, “as interdições/desinterdições variam com a análise temporal de cada Vara de Execução Criminal”.
A transferência das pessoas em privação de liberdade entre as unidades é prática constante, segundo a administração estadual. “O objetivo é sempre o de equilibrar o quantitativo de custodiados nos 182 presídios e penitenciárias, buscando ao máximo não comprometer aquelas unidades que são portas de entrada regionais, bem como atender os preceitos da Lei de Execução Penal (LEP)”, ressalta.
Especialista em segurança pública e pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ludmila Ribeiro alerta que a transferência de custodiados piora o funcionamento do sistema carcerário. “Em um Estado com unidades superlotadas não tem como fazer isso. Se transferir, piora ainda mais”.
Para a estudiosa, as soluções passam por outras esferas. “O ideal seria um plano de reformas e, em parceria com o Judiciário, pensar quem precisa efetivamente precisa ser preso. Boa parte dos presos do Estado é provisório. A grande questão é: o que fazer com as pessoas?”, indaga.
A atuação mais incisiva, por parte do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), também é cobrada por Ludmila. “O que temos hoje são interdições de alas, pátios, ou seja, interditam partes específicas de forma que não tem que deslocar muita gente. É aí que o MPMG deveria estar operante para ver os motivos de as unidade estarem interditadas e funcionando mesmo abandonadas”.
Manutenção e condições precárias
A falta de manutenção é um dos principais fatores, na visão de Ludmila, para entender o motivo de tantas interdições. “Só se pensa nas unidades do ponto de vista da construção, e não da manutenção. As penitenciárias são casas que precisam de uma série de reparos. Porém, elas são vistas como depósitos de presos, e aí não pensamos em como deixá-las operando para garantir a sobrevivência e menos ainda da infraestrutura física”, pondera.
O posicionamento da estudiosa é corroborado por Mirian dos Santos, presidente da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade. Para ela, as unidades prisionais do Estado não têm condições de aprisionar pessoas nem mesmo oferecer condições dignas de trabalho para os servidores. “São locais insalubres e inadequados para o ser humano trabalhar. Isso de interditar e permanecer funcionando normalmente se arrasta há anos. Tira uma pessoa da unidade e superlota a outra. O problema nunca é resolvido”, afirma Mirian.
A representante dos amigos e familiares dos custodiados defende ainda a progressão da pena. “Não adianta interditar e continuar prendendo. Vai colocar onde? E outra, temos pessoas em cumprimento de pena que poderiam estar no regime semiaberto ou aberto. No Brasil temos um problema de encarcerar demais, principalmente a juventude pobre, preta e periférica”.
A ausência de manutenção dos presídios também é fortemente criticada por Mirian. “O governo diz que vai construir novas unidades, mas não resolve. Quando inaugura uma, daqui a um ano vai estar superlotada. Constroem, mas não mantêm, não fazem reformas e deixam deteriorando. Cada dia que passa, o sistema só piora e fica degradante”.
Mirian elenca outros problemas percebidos por ela e por outras pessoas da associação. “Temos visto vários óbitos de detentos. A omissão de socorro ao preso gera a morte. Não se tem médicos nas unidades, mal um técnico de enfermagem. Recentemente, morreu um detento na Penitenciária José Maria Alkimin, em Ribeirão das Neves. Ele vinha pedindo ajuda havia dias e não foi levado a sério. O sistema é degradante, as pessoas adoecem. A situação é muito crítica”, desabafa.
Diálogo e aumento de vagas
Questionada por O TEMPO, a Sejusp informou que o governo de Minas tem trabalhado para aumentar o número de vagas nas unidades prisionais. “(Isso tem sido feito) seja por meio de novas obras ou por reformas, além da realização de ações que permitam o acesso a direitos dos custodiados, que podem culminar, inclusive, na soltura de internos”, disse.
Duas grandes obras estão em andamento, segundo a pasta, no Presídio Antônio Dutra Ladeira e no Ceresp de Juiz de Fora. Quando os serviços estiverem concluídos, serão geradas 285 novas vagas. “A entrega de novas unidades também é parte das soluções: Ubá, Divinópolis, Lavras e Iturama em breve receberão novas unidades prisionais, com geração de 1.388 novas vagas”.
Por fim, a secretaria pontuou que mantém diálogo diário com o MPMG, Defensoria Pública e Tribunal de Justiça para tratar sobre as interdições. “Embora as interdições sejam sensíveis, o assunto é diariamente abordado entre o Departamento Penitenciário de Minas Gerais e os órgãos de Justiça, a exemplo do acompanhamento sistemático do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo (GMF), do TJMG”, informou.
A reportagem questionou o Ministério Público sobre a atuação do órgão diante das unidades interditadas e aguarda o posicionamento. O texto será atualizado assim que o retorno for recebido.
Unidades interditadas
Confira as 62 unidades interditadas pela Justiça em Minas Gerais. A Sejusp não especificou qual tipo de interdição ocorre.
- Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto (PEN-CPFEP)
- Ceresp Gameleira – Centro de Remanejamento (Ceresp-BHZ)
- Penitenciária Professor Jason Soares Albergaria
- Presídio Antônio Dutra Ladeira-PRS
- Presídio de São Joaquim de Bicas I
- Ceresp Betim I – Centro Remanejamento
- Presídio São Joaquim de Bicas Il
- Ceresp Contagem I – Centro Remanejamento
- Presídio de Juatuba
- Presídio de Ibirité
- Presídio de Ouro Preto
- Penitenciária José Edson Cavalieri – Juiz de Fora
- Penitenciária Prof. Ariosvaldo Campos Pires – Juiz de Fora
- Presídio de Viçosa
- Penitenciária Dr. Manoel Martins Lisboa Júnior – Muriaé
- Ceresp Juiz de Fora (Ceresp JDF Esvaziada)
- Presídio de Visconde do Rio Branco
- Presídio de Muriaé
- Presídio de Ubá
- Presídio de Cataguases
- Presídio de Leopoldina
- Presídio de Carangola
- Presídio de Bicas
- Presídio de Rio Pomba
- Presídio de Matias Barbosa
- Presídio de Além Paraíba
- Presídio de Itapagipe
- Presídio de Lavras
- Presídio de Varginha
- Presídio de Três Pontas
- Presídio de Nova Serrana
- Presídio de Lagoa da Prata
- Presídio de Tarumirim
- Presídio Uberlândia – Jacy Assis
- Penitenciária Prof. João Pimenta da Veiga – Uberlândia
- Presídio de Araguari
- Presídio Regional de Montes Claros
- Presídio de Januária
- Presídio de Itacarambi
- Penitenciária Dênio Moreira de Carvalho Ipaba
- Ceresp de Ipatinga – Centro de Remanejamento
- Complexo Penitenciário de Ponte Nova
- Presídio de Manhuaçu
- Presídio de Inhapim
- Presídio de Timóteo
- Presídio de Barão de Cocais
- Presídio de Manhumirim
- Presídio de Resende Costa
- Presídio de Andrelândia
- Presídio de Capelinha
- Presídio de Itamarandiba
- Penitenciária Prof. Agostinho de Oliveira Júnior – Unaí (Paoj)
- Presídio de Unaí
- Presídio de São Lourenço
- Presídio de Itajubá
- Presídio de Piumhi
- Presídio de Alfenas
- Presídio de São Sebastião do Paraíso
- Presídio de Poços de Caldas
- Presídio de Campos Gerais
- Presídio de Machado
- Presídio Promotor José da Costa – Sete Lagoas
Nota da Sejusp
Cabe esclarecer que as interdições de unidades prisionais, sejam elas parciais ou totais, não são escalonadas com datas de início e fim. As interdições/desinterdições variam de acordo com a análise temporal de cada Vara de Execução Criminal. Outro ponto a ser elucidado diz respeito ao fechamento de unidades. Não estão sendo “fechadas” unidades prisionais. As unidades interditadas totalmente apenas deixam de receber custodiados, mas continuam operando normalmente, até que se chegue à lotação determinada pelo Poder Judiciário da comarca.
Em um sistema prisional com as dimensões do Estado de Minas Gerais, o diálogo com Ministério Público, Defensoria Pública e Tribunal de Justiça é diário. Portanto, embora as interdições sejam sensíveis, o assunto é diariamente abordado entre o Departamento Penitenciário de Minas Gerais e os órgãos de Justiça, a exemplo do acompanhamento sistemático do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo (GMF), do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. O complexo fluxo de entrada e saída de pessoas no sistema penitenciário de Minas Gerais, bem como o grande volume de entradas e desligamentos, possibilita ao Depen-MG realizar a gestão de vagas por meio da transferência entre unidades. O objetivo é sempre o de equilibrar o quantitativo de custodiados nos 182 presídios e penitenciárias, buscando ao máximo não comprometer aquelas unidades que são portas de entrada regionais, bem como atender os preceitos da Lei de Execução Penal (LEP).
O governo de Minas Gerais tem trabalhado para aumentar o número de vagas nas unidades prisionais – seja por meio de novas obras ou por reformas –, além de realizar ações que permitam o acesso a direitos dos custodiados, que podem culminar, inclusive, na soltura de internos. A realização de mutirões jurídicos é uma dessas ações que impactam positivamente esse fluxo prisional. Além dos atendimentos jurídicos ordinários e rotineiros, neste ano foram realizados 15 mutirões, com mais de 5.500 presos atendidos.
Há, ainda, duas grandes obras de reforma em andamento, no Presídio Antônio Dutra Ladeira e no Ceresp de Juiz de Fora, que ao término vão gerar 285 novas vagas. A entrega de novas unidades também é parte das soluções: Ubá, Divinópolis, Lavras e Iturama em breve receberão novas unidades prisionais, com geração de 1.388 novas vagas.
Foto: Penitenciária José Maria Alkimin, em Ribeirão das Neves — FOTOS ALEX DE JESUS