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PELÉ

Brasileiro mais homenageado do mundo, Pelé foi condecorado por Elizabeth II e parou guerra

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Um dos atletas mais conhecidos da história moderna, o rei dizia que seu talento vinha de Deus e nunca deixou de reverenciar sua grande companheira, a bola

Pelé realizou façanhas que o tornaram o rei do futebol. Foi o único jogador que parou uma guerra, “expulsou” um árbitro de campo, marcou mais de 1.200 gols e conquistou três Copas do Mundo.

Era o brasileiro mais conhecido e mais homenageado no mundo e morreu nesta quinta-feira (29), aos 82 anos, após uma batalha contra o câncer, confirmou o hospital onde ele estava internado em São Paulo desde o fim de novembro.

Um dos atletas mais conhecidos da história moderna, o rei dizia que seu talento vinha de Deus e nunca deixou de reverenciar sua grande companheira, a bola.

“Se eu pudesse me chamaria Edson Arantes do Nascimento Bola. Seria a única maneira de agradecer o que ela fez por mim”, afirmava o astro.

A lenda do futebol morreu nesta quinta após uma prolongada batalha contra o câncer e um histórico recente de complicações de saúde que incluíram problemas no quadril que afetaram a mobilidade de um atleta que encantou o mundo justamente por seus movimentos com a bola dentro de campo.

Em setembro de 2021 Pelé foi submetido a cirurgia para a retirada de um tumor no cólon, e desde então vinha realizando tratamento de quimioterapia.

O ex-jogador foi internado há cerca de um mês para reavaliar o tratamento, e também foi diagnosticado com uma infecção respiratória — a qual tratou com antibióticos. Em dezembro, o hospital informou que o câncer se agravou, o que levou a disfunções renal e cardíaca.

Hospitalizado, Pelé recebeu várias homenagens ao longo da Copa do Mundo, incluindo um bandeirão com sua imagem em meio à torcida brasileira e uma faixa carregada pelos jogadores da seleção.

Em suas redes sociais, publicou comentários sobre o Mundial, como uma mensagem a Neymar após a eliminação do Brasil e uma mensagem de parabéns à campeã Argentina.

Pelé brilhou pela seleção brasileira logo aos 17 anos, sendo campeão da Copa de 1958, primeiro título mundial do futebol brasileiro e que ajudou a elevar a autoestima do país do cenário global, com atuação importante e seis gols.

Quatro anos depois, participou da campanha vitoriosa no Mundial do Chile, apesar de ter ficado fora de maior parte da campanha devido a uma lesão, e em 1970 comandou a equipe tricampeã no México –até hoje considerado um dos melhores times de futebol da história.

A habilidade de Pelé era ímpar. Ele combinava arrancada impressionante, dribles desconcertantes e finalizações precisas com os dois pés e também de cabeça. Chegou até a atuar como goleiro com bom desempenho. Para muitos, o jogador mais completo do esporte.

“Eu disse para mim mesmo antes do jogo: ‘ele é feito de carne e osso como todo mundo’. Mas eu estava errado”, disse Tarcisio Burgnich, o defensor italiano encarregado de marcar Pelé na final da Copa de 1970, na qual o Brasil bateu a Itália por 4 x 1.

Nascido na cidade mineira de Três Corações em 23 de outubro de 1940, Edson Arantes do Nascimento era filho de Celeste e do ex-jogador Dondinho. Em 1945, a família mudou-se para Bauru, no interior paulista, onde o menino Pelé começou a jogar futebol. De lá foi levado ao Santos e, em 1956, iniciou uma carreira espetacular.

Pela equipe paulista, Pelé ganhou 45 títulos, sendo dois mundiais, e marcou 1.091 dos seus 1.281 gols em 1.366 jogos, entre eles o milésimo gol, de pênalti, em 1969, quando disse a famosa frase: “O povo brasileiro não pode esquecer das criancinhas”, enquanto era cercado por torcedores, jornalistas e fotógrafos que invadiram o gramado do Maracanã para comemorar o feito.

No mesmo ano aconteceu outra passagem memorável de Pelé pelo Santos. Em meio a uma guerra civil na África, as forças rivais declararam uma trégua para que Pelé e seus companheiros do Santos passassem com segurança entre Kinshasa e Brazzaville, como é mostrado no filme “Pelé Eterno”.

No entanto, o próprio Pelé dizia que não sabia se os combates efetivamente pararam, mas ao menos uma rodovia foi mantida em paz para que o time passasse.

“Falaram que a guerra foi interrompida para que eu pudesse jogar uma partida”, contou o ex-jogador no livro “Pelé – A Importância do Futebol”.  

Campeão do Campeonato Paulista por 10 vezes e artilheiro do torneio em 11 ocasiões, uma delas com o recorde de 58 gols, o ex-camisa 10 é ainda o maior goleador da seleção brasileira, com 95 gols em 113 jogos, e conta com uma série de prêmios. Entre eles o título de “Atleta do Século 20” concedido pelo jornal francês L’Equipe.

Em janeiro de 2014, recebeu uma homenagem especial da Fifa e da revista France Football, que concederam a Pelé a Bola de Ouro, prêmio criado em 1956 e que inicialmente premiava apenas os europeus.

“Recebi tantos prêmios, só que eu tinha ciúmes, porque todos recebiam a Bola de Ouro, mas não tinha prêmio para sul-americanos. Agora posso dizer que completei minha coleção”, disse ele à época.

Pelé foi ainda condecorado com o título de “sir” do Império Britânico, em 1997 (condecorado pela então rainha Elizabeth II), e dois anos depois foi eleito o “Maior Futebolista do Século” pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

“Tiraram o juiz”

Pelé adorava contar histórias engraçadas que viveu pelos campos de futebol. Uma delas ocorreu na Colômbia durante partida pelo Santos. Numa confusão entre jogadores, o árbitro expulsou Pelé, que garantia que não estava brigando e culpava o companheiro Coutinho.

Quando se preparava para deixar o gramado, Pelé ouviu de um integrante da comissão técnica: “Tiraram o juiz, botaram o bandeirinha para apitar e você volta”, afirmou o ex-jogador numa entrevista coletiva, aos risos.

Todos queriam vê-lo jogar. O Santos fazia excursões mundo afora para plateias ávidas por vê-lo em ação, e Pelé recebeu muitas propostas para deixar o país.

“Eu fiquei no Santos por toda a minha carreira porque eu quis ficar. Tive proposta para ir para o Real Madrid, para o Milan, para vários clubes. Só saí do Santos para ir para o Cosmos para levar o futebol para os Estados Unidos”, dizia o ex-jogador, que encerrou sua carreira em 1977.

Em 2000, a Fifa o escolheu como o maior jogador de futebol do Século 20, numa polêmica eleição que teve o argentino Diego Maradona como líder na votação pela internet, e o brasileiro como o escolhido por especialistas.

A entidade que controla o futebol mundial acabou concedendo o prêmio principal a Pelé, enquanto Maradona levou a premiação “Fifa Internet”.

A “competição” com Maradona sobre o melhor de todos os tempos não incomodava Pelé.

Em entrevista à Reuters em 2010, o brasileiro disse que “primeiro os argentinos têm que resolver quem é o melhor deles”, argumentando que já quiseram compará-lo com Alfredo Di Stéfano, argentino naturalizado espanhol, além de Maradona, que mais recentemente teve também a “concorrência” de Lionel Messi na preferência dos argentinos.

Quando Maradona morreu, em novembro de 2020, vítima de um ataque cardíaco, Pelé o homenageou em suas redes sociais, deixando de lado a controvérsia e as algumas vezes em que foi publicamente criticado pelo argentino. O rei do futebol disse que perdeu um amigo.

“Com certeza um dia vamos bater uma bola juntos lá no céu”, disse Pelé à época por meio de sua assessoria de imprensa.

Pelé e Edson

Em função de sua notoriedade, Pelé teve uma vida agitada também fora dos campos. Atuou como músico e ator em algumas novelas e filmes e, depois de abandonar o futebol, se tornou embaixador para Ecologia e Meio Ambiente (ONU, em 1992), embaixador da Boa Vontade (Unesco, em 1993), e embaixador para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco, em 1994).

Foi ainda embaixador honorário do Brasil para a Copa do Mundo de 2014, embora não tenha participado muito do Mundial e tenha criticado a competição em alguns momentos, por causa dos atrasos nos preparativos.

Sempre questionado sobre todos os assuntos relacionados ao futebol, Pelé era famoso por fazer previsões equivocadas, como a de que a Colômbia poderia ser campeã mundial em 1994 ou de que uma seleção africana ganharia um título mundial até o fim do milênio passado.

Muitas vezes, confrontado com declarações polêmicas ou com situações controversas de sua vida pessoal, ele próprio buscava separar a lenda do homem: a primeira era o Pelé, o segundo o Edson.

A função mais importante que exerceu como ex-jogador foi a de ministro do Esporte, de 1995 a 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso, quando fez a Lei Pelé, que acabou com o passe no futebol brasileiro.

A medida, saudada à época como uma Lei Áurea dos jogadores, foi frequentemente alvo de reclamações posteriormente e apontada por críticos como um dos fatores que colaborou para as dificuldades de muitos clubes brasileiros acostumados a produzir craques em série.

Pelé também gostava de ressaltar a importância da família em sua vida e carreira. Em 1966, ele casou-se com Rosemeri Cholbi, com quem teve três filhos: Kelly Cristina, Jennifer e Edson (Edinho), que foi goleiro do Santos e depois teve problemas com a Justiça e chegou a ser preso. O casamento terminou em 1978.

Pelé ainda teve duas filhas: Flávia Kurtz, reconhecida publicamente em 2002, e Sandra Regina, que morreu em 2006 após travar uma longa batalha judicial pelo reconhecimento de sua paternidade.

Em 1994, o ex-jogador se casou com Assíria Lemos, com quem teve mais dois filhos, os gêmeos Joshua e Celeste. Eles se separaram em 2008.

“Sempre achei que a família é a base de tudo, e mesmo com as duas separações, nós somos muito unidos, temos muita amizade, e isso é uma coisa que eu preservo”, afirmou Pelé durante uma entrevista.

(Edição de Pedro Fonseca e Eduardo Simões)

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