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Segurança

A cada quatro horas, uma criança é vítima de crimes na internet em Minas Gerais

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A mineira Maria Eduarda, de 4 anos, foi alvo de ataques racistas nas redes sociais pouco depois de vencer o concurso Miss Minas Gerais Kids 2022, em julho deste ano. “Isso não é cabelo de princesa, vamos ser sinceros. Tá mais pra bruxa”, disse um internauta. O caso ganhou destaque, e, desde então, a menina passou a integrar um levantamento que serve de alerta aos tutores e também às instituições de segurança pública do Estado. A cada quatro horas, uma criança ou adolescente de Minas Gerais é alvo de crimes na internet.

“São crimes contra a honra, injúrias, difamações, constrangimento ilegal e até mesmo ameaça. Muitas vezes, a gente pode verificar casos de bullying e de stalking”, explica o delegado da Divisão Especializada de Investigação ao Crime Cibernético da Polícia Civil de Minas Gerais, Renato Nunes Guimarães. O levantamento, feito pela própria PC, indicou que 1.427 casos foram registrados no período entre janeiro e 1º de setembro deste ano. Em todo o ano de 2021, foram 2.048 vítimas, o que representa uma média mensal de 170 registros. A média deste ano é um pouco maior e gira em torno de 178 casos em que crianças e adolescentes estão no centro da violência cibernética.

No episódio com a mineira de 4 anos, além do comentário racista, a publicação de outro internauta também serviu como alerta para a mãe. O seguidor de uma das redes sociais da menina elogiou o umbigo dela em uma das fotos em que a criança aparecia vestida com uma blusa que deixava à mostra parte da barriga. “Eu até optei por apagar a foto, não sabia quem realmente estava do outro lado”, relembra a mãe de Maria Eduarda, a massagista Adriana Barbosa Santos de Souza, de 32 anos.

Porém, esses não foram os únicos episódios. A tentativa de proximidade de outro seguidor também causou insegurança. “Um perfil, que se identificava como uma criança, começou a mandar mensagens e a dizer que amava a minha filha. Esse seguidor enviou o número do WhatsApp dele, chegou a ligar em vídeo e a dizer que estava fascinado com a Duda e que queria ser amigo dela. Eu fiquei muito preocupada, pois não sabia se era realmente uma criança ou um adulto”, conta a mãe.

A partir desses dois novos episódios e também do comentário racista, Adriana de Souza, que também é responsável por administrar as redes sociais da filha, com mais de 35,4 mil de seguidores, começou a ter ainda mais cuidado com os conteúdos publicados. “Tem que ter certos cuidados, já que ela está muito exposta na internet”, diz a massagista, que teme que a filha se torne vítima de outros crimes na web.

Para o delegado Renato Nunes, da Divisão Especializada de Investigação ao Crime Cibernético, a cautela da mãe de Maria Eduarda e o acompanhamento próximo ao que a filha consome na internet fazem parte de uma combinação preventiva e necessária neste contexto em que cada vez mais a sociedade se relaciona com o ambiente digital. “Os principais cuidados são dos familiares e dos responsáveis pela criança. É importante monitorar as redes sociais, os aplicativos que ela usa e até mesmo restringir determinados acessos, colocando códigos de segurança”, indica.

Excesso de informações pode oferecer riscos, afirmam especialistas

Profissionais da área de segurança também reforçam que diversas ações podem ser tomadas para tentar minimizar ou mesmo eliminar os riscos de crimes direcionados a crianças e adolescentes na internet. Dessa forma, uma das primeiras atitudes, de acordo com o especialista em segurança Arnaldo Comde, deve partir justamente dos responsáveis pelos menores, evitando o que ele caracteriza como “excesso de informações”.

“Compartilhar muitas coisas dos filhos pode ser perigoso. O excesso de informações oferece riscos sob quaisquer circunstâncias. Ser mais discreto pode ajudar a não deixar algumas portas abertas”, diz ele. O também especialista em segurança Jorge Tassi concorda. “A alta exposição, o compartilhamento da rotina, acabam fazendo com que determinadas informações se transformem em ‘domínio público’”, afirma.

Outro passo importante, segundo Comde, é manter um diálogo aberto com crianças e adolescentes. Ele destaca que atualmente existem filtros e bloqueios que podem limitar as ações dos menores online, mas isso está longe de ser uma solução.

“Utilizando esses bloqueios, você pode até resolver um problema, mas cria outro, já que está delegando ao sistema a responsabilidade sobre o seu filho. A responsabilidade não pode ser do equipamento, mas sim da pessoa que orienta e daquela que o utiliza”, afirma ele. “Por isso, o importante é ter um acompanhamento dos jovens, com esclarecimentos, com proximidade para que eles tenham a confiança de conversar, contar o que viram, tirar dúvidas”, diz.

Além do diálogo, Tassi também afirma que os responsáveis pelas crianças devem impor limites no que diz respeito à utilização da internet. “Os processos que envolvem a tecnologia, às vezes, são muito invasivos. Do outro lado, tem uma pessoa que pode simplesmente construir aquilo que você acha que ela é. Qualquer um pode ser enganado, por isso é importante estar atento e limitar o acesso de crianças e adolescentes a determinados conteúdos, estando atento também às pessoas com quem conversam”, destaca.

O perfil do criminoso

Os autores dos crimes cibernéticos em Minas Gerais possuem um perfil em comum e um jeito de agir que já é conhecido pelas equipes de segurança pública. Segundo o delegado da Divisão Especializada de Investigação ao Crime Cibernético, Renato Nunes Guimarães, esses criminosos fazem o primeiro contato por meio de redes sociais ou de salas de jogos eletrônicos, utilizando uma identidade falsa. “São maiores de 18 anos e que se passam por adolescentes, do sexo masculino ou feminino, conforme a abordagem”, indica.

Por meio desses perfis falsos em redes sociais ou dos chats das salas de games, os suspeitos buscam se aproximar das crianças e dos adolescentes, de modo a conseguir construir um vínculo de afetividade. “Esses criminosos já possuem informações prévias sobre as vítimas. O local de estudo, as preferências esportivas, por exemplo. Isso porque eles vasculham as redes dos alvos”, aponta o delegado.

Segundo Nunes, com essa essa relação de proximidade, os criminosos ganham a confiança das crianças e dos adolescentes e começam, então, a fazer diversos pedidos, como fotos e vídeos eróticos, além de praticar atos libidinosos durante as conversas virtuais. “Nos crimes de pedofilia, por exemplo, a abordagem tem esse viés amistoso. Quando a vítima não atende aos pedidos do criminoso, começam as ameaças. Eles tentam intimidar dizendo que vão publicar as fotos, passar para os familiares e para as pessoas do ciclo de amizade da vítima”, indica.

Internet faz parte da rotina das crianças

Para a professora de psicologia Isabel Pimenta Spínola Castro, especialista em saúde da criança e do adolescente, a sociedade está cada vez mais dependente da tecnologia, e a internet é parte desse processo, que afeta diretamente o processo de educação e desenvolvimento das crianças. “É preciso levar em consideração que a internet faz parte do nosso mundo, que é difícil educar uma criança hoje em dia sem esse acesso à web”, indica Isabel.

A especialista aponta, no entanto, que o uso da tecnologia deve ser feito de forma regrada e com a finalidade de colaborar com a formação dos menores. “Não é só entregar um celular e um computador para a criança, isso tem que ser acompanhado de uma orientação. Esse diálogo é importante porque fortalece outras habilidades e não substitui o contato real pelo virtual”, completa.

Ela sugere que, em casos em que as crianças façam uso excessivo da internet e/ou se tornem vítimas da criminalidade nesses espaços, os pais devem procurar atendimento psicológico para elas. “Isso é importante para entender quais foram os impactos, deixar que as crianças falem sobre o que estão sentindo a partir dessa experiência”, pontua. A especialista considera ser fundamental a procura pelas instituições de segurança, quando necessário, e também esse acompanhamento de saúde mental para os pais das vítimas. “São casos que trazem impactos também para os responsáveis. É preciso que eles fiquem atentos a isso”, completa.

A exposição de crianças e adolescentes às telas, conforme a Organização Mundial da Saúde

Crianças abaixo de 18 meses

  • Nenhuma exposição às telas, exceto por videochamadas (para pais e avós, por exemplo).

Crianças entre 18 meses e 2 anos
Recomendação: pouca ou nenhuma exposição a telas

  • Esse é um período crítico para o desenvolvimento da criança, então estimule ao máximo a interação física com outras pessoas e a sua criatividade.
  • Se a criança for exposta a telas, assista em conjunto e escolha conteúdos educativos de qualidade, que ajudarão a criança a compreender o que está assistindo. Limite o conteúdo a uma hora diária.

Crianças entre 3 e 5 anos
Recomendação: até uma hora ao dia

  • Tente planejar o tempo de assistir TV com antecedência e resista à tentação de usá-la para acalmar e distrair a criança.
  • Crianças nessa idade podem interagir com os personagens, então ajude-as a entender o que estão vendo e aplicar isso ao mundo real.
  • Muitos tipos de mídia e desenhos podem ser encontrados em outras versões, como as impressas. Tente encontrar livros e brinquedos para que as crianças brinquem e interajam com seus personagens favoritos, só que fora da tela. É outra maneira de envolver as crianças em brincadeiras criativas!

Crianças entre 6 e 10 anos
Recomendação: entre uma hora e uma hora e meia ao dia

  • Tenha limites com o tempo gasto em mídias e telas.
  • Avalie o conteúdo que é consumido.
  • Nessa idade a criança já está na escola, então certifique-se de que ela não tenha o hábito de ficar exposta a TV, tablet e celular até que tenha terminado as tarefas de casa.
  • Entre 6 e 10 anos, as crianças já adquirem algumas habilidades tecnológicas, então tente balancear o uso criativo e aquele utilizado apenas para diversão.
  • Com a idade, os pais podem dar às crianças um pouco mais de controle sobre suas escolhas e manejo do tempo com o celular/tablet/TV.
  • Certifique-se de que as telas não ocupem o tempo que deve ser gasto com horas de sono adequadas, atividade física e outras atividades essenciais à saúde da criança.

Crianças entre 11 e 13 anos
Recomendação: até duas horas ao dia

  • Nessa idade, a criança já entende o conceito de “equilíbrio”. Os pais devem ajudá-la a entender como distribuir o tempo de exposição às telas ao longo do dia.
  • Se você notar que a criança está exagerando no uso dos videogames, por exemplo, há uma semana ou duas, tente ajudá-lo a entender os benefícios de realizar essas atividades com moderação.
  • Ajude a criança a reconhecer que está gastando muito tempo em uma única coisa. Ter essa percepção poderá ajudar a criança por toda sua vida.

Onde denunciar crimes cibernéticos com crianças e adolescentes

  • Polícia Militar – 190: quando a criança está correndo risco imediato
  • Disque 100: recebe denúncias de violações de direitos humanos. A denúncia é anônima e pode ser feita por qualquer pessoa
  • Delegacias especializadas no atendimento de crianças ou de mulheres.

Fonte: O Tempo

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